[Para uma compreensão político-social do pensamento de Olavo de Carvalho, veja meu ensaio Conservadorismo Teocrático neste blog]
Publicado na Revista Época em 28/03/2019
Autor: João Pedro Sabino Guimarães
Ele é o guru da nova direita brasileira. Durante anos foi o principal crítico da intelectualidade de esquerda e do projeto de poder do PT. Sempre implacável nos embates, comprou brigas com boa parte do establishment cultural do país. Seus admiradores o classificam como “nosso maior filósofo e educador”. Seus detratores o relegam à categoria de “astrólogo”.
Eis Olavo de Carvalho, o autonomeado “filósofo”, que foi militante do PCB nos Anos de Chumbo e duas décadas mais tarde transmutou-se no mais temível inimigo do “marxismo cultural”. Ele mesmo explica as razões dessa chrysopoeia filosofal:
“Os senhores não têm a menor ideia de como é bom, para um sujeito que ajudou a construir uma mentira na juventude, poder desmontá-la na maturidade, tijolo a tijolo, com a meticulosidade sádica do demolidor."
Por um quarto de século, o autor de O imbecil
coletivo (1996) e O mínimo que você precisa saber para não ser um
idiota (2013) tem-se empenhado em dar novos contornos à práxis
nietzschiana da filosofia a marretadas. Sempre enérgico na denúncia
do comunismo, dedicou-se a expor a articulação continental dos
partidos e agremiações de esquerda, que caracterizou como o Foro de
São Paulo:
“Um dos instrumentos mais engenhosos
utilizados para isso foi a duplicação das vias de ação
partidária, uma nacional e ostensiva, denominada oficialmente PT ou
‘governo’, a outra internacional e discretíssima chamada ‘Foro
de São Paulo’, o mais importante e poderoso órgão político
latino-americano.”
Cedo também condenou o sistema político da Nova
República, apontando a suposta repartição do poder entre a
esquerda moderada e a esquerda radical:
“O PT e o PSDB foram essencialmente
criações de um mesmo grupo de intelectuais esquerdistas empenhados
em aplicar no Brasil o que Lênin chamava de ‘estratégia das
tesouras’: a partilha do espaço político entre dois partidos de
esquerda, um moderado, outro radical, de modo a eliminar toda
resistência conservadora ao avanço da hegemonia esquerdista.”
Outras obsessões de Olavo de Carvalho têm sido o
“globalismo”, que ele acredita ser o projeto de governo mundial,
conduzido por elites transnacionais de inspiração maçônica; e as
“técnicas de manipulação das massas”, desenvolvidas pela
psicologia moderna e por filósofos de esquerda como Antonio Gramsci
e os integrantes da Escola de Frankfurt:
“Os acontecimentos mais básicos dos
últimos 50 anos são: primeiro, a ascensão de elites globalistas,
desligadas de qualquer interesse nacional identificável e empenhadas
na construção não somente de um Estado mundial, mas de uma
pseudocivilização planetária unificada, inteiramente artificial,
concebida não como expressão da sociedade, mas como instrumento de
controle da sociedade pelo Estado; segundo, os progressos fabulosos
das ciências humanas, que depositam nas mãos dessas elites meios de
dominação social jamais sonhados pelos tiranos de outras épocas.”
Conhecido por seus amores inventados e paixões
cruéis desenfreadas, Olavo recusa o rótulo de “exagerado”.
Assim ele justifica seu proverbial destempero vocabular:
“É verdade que Olavo de Carvalho usa às
vezes palavras duras, deprimentes, humilhantes. Mas jamais elevou a
voz em público para condenar qualquer conduta privada, por
abominável que lhe parecesse.”
A realidade se mostra um tanto distinta. A
saraivada de insultos e impropérios saídos de sua metralhadora
giratória já atingiu nomes como Gilberto Gil, Chico Buarque,
Dorival Caymmi, Dias Gomes, Janete Clair, José Américo Pessanha,
Gerd Bornheim, Leandro Konder, José Arthur Giannotti, Wilson Martins
e Reinaldo Azevedo, entre outros. Isso sem contar os inúmeros golpes
abaixo da cintura que desfere diariamente contra os próceres do
esquerdismo moreno. Vejamos o que disse do sempre lúcido e ponderado
Fernando Gabeira:
“É uma vergonha nacional que um sujeito
obviamente desqualificado, tolo, descoordenado de cabeça, seja
aceito como intelectual por conta de antigos feitos de armas que um
analfabeto poderia realizar com iguais méritos, e que, aliás, por
mais autênticos que tenham sido, mal o habilitariam ao título de
sargento honorário do exército de libertação da Zâmbia. O
prestígio de Gabeira como ‘pensador’ é exemplo típico do nosso
provincianismo cultural, onde popularidade é sinônimo de elevação
intelectual.”
Mas Olavo não se restringe ao pessoal. Ele, com
frequência, desfere ataques ainda mais ferozes contra seus inimigos
coletivos:
“Não conheço um só líder
esquerdista, petista, gayzista, africanista ou feminista que não
corresponda ponto por ponto a essa descrição, que corresponde por
sua vez ao quadro clássico da histeria. (...) A presença de um
grande número de histéricos nos altos postos de uma sociedade é
garantia de deterioração de todas as relações humanas, de
proliferação incontrolável da mentira, da
desonestidade e do crime.”
Seu instinto de criar polêmicas ao estilo do
“velho da montanha” se mostra especialmente virulento no combate
às ambições políticas ou culturais de algumas minorias:
“Alguém tem de dizer aos negros a
verdade: a verdade é que todos os ritos iorubás não valem uma
página de Jalal ad-Din Rumi e a história inteira do samba não vale
três compassos de Bach.”
“Não se encontrará nas fileiras gays
um único santo, místico ou homem espiritual de elevada estatura.
Iguais aos outros no mal, os gays têm escassa folha de serviços na
prática do bem.”
Tão compassivo ativismo filosófico custou a
Olavo de Carvalho não poucos desafetos. Talvez por isso ele tenha
decidido mudar-se, em 2003, para os Estados Unidos. Estabelecido em
Richmond, na Virgínia, surfou com destreza a onda da internet,
tornando-se um pioneiro youtuber. A despeito de seu imenso sucesso de
público, ou talvez por causa dele, passou a lamentar o estado da
cultura brasileira:
“Desde que me distanciei do Brasil,
tenho visto a inteligência dos meus compatriotas cair para níveis
que às vezes ameaçam raiar o sub-humano.”
Aos poucos, Olavo construiu uma verdadeira legião
de seguidores on-line. Em seu Seminário de Filosofia, formou toda
uma nova geração de políticos, ativistas e burocratas de direita.
Termos como “engenharia social”, “ideologia de gênero” e
“marxismo cultural” entraram para o léxico político brasileiro.
E sua refinada mensagem ecoou pelo país:
“Há quatro décadas a tropa de choque
acantonada nas escolas programa esses meninos para ler e raciocinar
como cães que salivam ou rosnam ante meros signos. (...) Um deles
ouve, por exemplo, a palavra ‘virtude’. Pouco importa o contexto.
Instantaneamente produz-se em sua rede neuronal a cadeia associativa:
virtude-moral-catolicismo-conservadorismo-repressão-ditadura-racismo-genocídio.
E o bicho já sai gritando: É a direita! (...) De maneira oposta e
complementar, se ouve a palavra ‘social’, começa a salivar de
gozo, arrastado pelo atrativo mágico das imagens:
social-socialismo-justiça-igualdade-liberdade-sexo-e-cocaína-de-graça-oba!”
Após quase três décadas de incessantes
combates, Olavo de Carvalho chegou enfim ao topo do mundo. Ungido
sacerdote, profeta e conselheiro-mor do novo governo, sente-se
autorizado a indicar ministros de Estado, passar pitos em deputados
federais, desafiar juízes do Supremo, confrontar generais de quatro
estrelas e espinafrar publicamente o vice-presidente da República:
Logo após a vitória eleitoral, Olavo recomendou
ao presidente eleito “quebrar as pernas de seus inimigos,
impiedosamente”. Desferiu também críticas aos servidores públicos
de inclinação weberiana, vistos como simpatizantes do “marxismo
cultural” e membros do “deep state”. Transcendendo o mero papel
de intelectual engajado, almeja converter-se em ideólogo do novo
governo:
“Se esbarrasse na rua com algum dos
nossos políticos ditos ‘de direita’, eu lhe perguntaria o
seguinte: ‘Você quer destruir a esquerda, destruí-la
politicamente, socialmente, culturalmente, de modo que nunca mais se
levante e que ser esquerdista se torne uma vergonha que ninguém ouse
confessar em público?’.”
Olavo imagina-se, acima de tudo, uma espécie de
salvador espiritual da nação:
“Se me perguntarem quais são os
problemas essenciais do Brasil, responderei sem a menor dificuldade:
(...) A destruição completa da alta cultura, num estado
catastrófico de favelização intelectual onde a função de
respiradouro para a grande circulação de ideias do mundo, que
caberia à classe acadêmica como um todo, é exercida praticamente
por um único indivíduo, um último sobrevivente.”
Ele mesmo, obviamente. Mas o conceito que o mago
de Richmond nos apresenta de “alta cultura” tem suas sutilezas.
Como herdeiro da augusta tradição do pensamento metafísico, Olavo
não perde uma oportunidade de demonstrar ao mundo a elegância de
sua dialética:
“Combater o consumo de drogas por meio
da liberação é tão inteligente quanto defender-se da tentação
do adultério comendo a mulher do vizinho três vezes por semana, no
intuito de tornar-se imune aos encantos das demais esposas dos
arredores. Pode-se também suprimir o homossexualismo dando o
traseiro por aí até que ele se torne insensível.”
O trecho acima não é um caso isolado. É antes
um traço essencial, um cacoete ontológico, um jeito de ser nascido
da própria natureza do autor de A nova era e a revolução cultural
(1994):
“Aí é que entra a missão providencial
dos intelectuais. Sua função é precisamente pôr um fim a essa
suruba ideológica. (...) São lições de Antônio Só-a-Cabecinha
Gramsci.”
A incompatibilidade desse modo de ser com o ideal
cristão é patente. Mas o “filósofo” de O jardim das aflições
(1995) não compreende os ensinamentos daquele que agonizou no
Getsêmani:
“Quando reagem aos ataques cada vez mais
virulentos que a religião sofre da parte de gayzistas, abortistas,
feministas enragées, neocomunistas, iluministas deslumbrados etc.,
certos católicos e protestantes invertem a ordem das prioridades:
colocam menos empenho em vencer o adversário do que em evitar, por
todos os meios, ‘combatê-los à maneira do Olavo
de Carvalho’. O que querem dizer com isso é que Olavo de Carvalho
é violento, cruel e impiedoso, humilhando o inimigo até fazê-lo
fugir com o rabo entre as pernas, ao passo que elas, as almas
cristianíssimas, piedosíssimas, boníssimas, preferem ‘odiar o
pecado, jamais o pecador’.”
Exatamente. Ser cristão requer esse tipo de
discernimento. Mas, para explicar ao leitor a recusa de Olavo de
Carvalho em compreender seu próprio insight, será preciso recuar no
tempo e demonstrar de onde veio e em que consiste o pensamento desse
vitriólico filósofo das multidões.
I – Olavo e a Escola Perenialista
Olavo de Carvalho é um produto da contracultura.
No final dos anos 60, sem ter sequer o primeiro grau completo,
começou a ganhar a vida como jornalista. Após breve envolvimento
com o Partido Comunista Brasileiro (PCB), optou pelo “desbunde”,
entregando-se de corpo e alma ao esoterismo.
“O esoterismo é a ciência universal
por excelência, é o conhecimento e a realização da unidade.”
No final dos anos 70 e início dos anos 80, Olavo
foi colaborador da revista Planeta, principal órgão de divulgação
do espiritismo, da astrologia, alquimia, do hermetismo, tarô, da
ufologia e de outros baratos. Esse mergulho na quinta dimensão
levou-o à escola “tradicionalista”, ou “perenialista”,
inaugurada por René Guénon (1886-1951), um ocultista francês com
ambições filosóficas, que mais tarde se converteu ao islã.
Com base nos ensinamentos de Guénon e seus
seguidores, Olavo publicou uma série de artigos sobre o perenialismo
na revista Planeta, além de seis livros sobre astrologia e
esoterismo: A imagem do homem na astrologia (1980), Questões de
simbolismo astrológico (1983), Astros e símbolos (1985), Astrologia
e religião (1986), Fronteiras da tradição (1986) e O caráter como
forma pura da personalidade: elementos para uma astrocaracterologia
(1992). Sobre essa fase, ele explica:
“Os livros que escrevi sobre Astrologia
foram redigidos para um grupo de pessoas que estavam metidas até a
goela no esoterismo islâmico. Para entender-se o que está escrito,
é preciso saber para quem foi escrito.”
Nos anos 80, por influência do perenialista
Frithjof Schuon (1907-1998), Olavo passou a viver em uma comunidade
mística islâmica (tariqa), em São Paulo. Nesse período, praticou
o poliamor, tiranizou a família e aprofundou-se no estudo da gnose
sufi. Os episódios foram relatados por sua filha mais velha, Heloísa
de Carvalho, em entrevista à revista Carta Capital e em carta aberta
ao pai, publicada nas redes sociais. Embora um autor não deva ser
criticado por seus erros passados, o incidente nos remete à passagem
de A nova era e a revolução cultural em que Olavo especula:
“O que Gramsci fez com a própria filha,
por que não o faria com os filhos dos outros?”
Para entendermos a viagem de Olavo de Carvalho às
profundezas do “islamismo cultural”, é preciso conhecer um pouco
mais do perenialismo. René Guénon, fundador dessa vertente do
esoterismo, mudou-se, jovem ainda, para Paris, onde se tornou
discípulo do famoso Papus, criador da linhagem martinista do
ocultismo. Insatisfeito com a demora em ser iniciado nos “mistérios
superiores”, tomou rumo próprio. Aos 24 anos, foi enfim iniciado,
durante rito funesto, no qual invocou o espírito de Jacques de
Molay, o último grão-mestre dos templários, morto na fogueira, em
1314. O episódio é comentado pelo estudioso do perenialismo Mark
Sedgwick, em seu bem documentado livro Against the modern world:
traditionalism and the secret intellectual history of the 20th
century:
“As instruções de Jacques de Molay,
comunicadas a Guénon durante sessão em 1908, foram de restabelecer
a Ordem do Templo. Guénon prosseguiu com a criação
da Ordem Renovada do Templo, com a ajuda de cinco outros
martinistas.”
A partir de então, Guénon deu início a intensa
atividade intelectual. Em seus artigos e livros, empenhou-se em
criticar maçons, kardecistas e teosofistas, denunciando-os como
adeptos de vertentes contrainiciáticas do esoterismo, corrompidas
pelo evolucionismo darwinista e por ideias socialistas. Nesse embate,
desenvolveu uma lendária paranoia, passando a ver conspirações por
toda parte:
“A Inglaterra é chamada a ditar suas
leis para o mundo inteiro (...). Esta será a realização dos
‘Estados Unidos do Mundo’, mas sob a égide da ‘nação
dirigente’ e para seu exclusivo benefício; assim o
internacionalismo dos chefes do teosofismo se revela no imperialismo
britânico levado ao seu grau mais extremo.”
Nem sequer os protestantes escapavam às críticas
de René Guénon:
“A propósito das relações entre o
teosofismo e o protestantismo, uma questão se coloca: se estimamos
que o teosofismo é anticristão em princípio (...) teremos então
de concluir que o protestantismo, tão logo suas tendências sejam
levadas ao extremo, há de chegar logicamente ao anticristianismo?
Por paradoxal que tal conclusão pareça à primeira vista (sobretudo
quando nos lembramos que muitas seitas protestantes gostam de se
dizer ‘cristãs’ sem epíteto, ou ainda ‘evangélicas’),
existem fatos que são ao menos suscetíveis de dar verossimilhança
a semelhante conclusão.”
Em sua busca espiritual, Guénon elaborou uma nova
síntese ocultista, supostamente “metafísica” e influenciada por
elementos vindos de doutrinas orientais e da gnose clássica. Imbuído
de fortíssimo idealismo romântico e de igual dose de revisionismo
histórico, passou a fundir todos os caminhos espirituais em uma
única e secreta “filosofia perene”, que tudo engloba e nada
explica.
“Por Gnose aqui se deve entender o
Conhecimento tradicional que constitui o fundo comum de todas as
iniciações, cujas doutrinas e símbolos foram transmitidos, desde a
mais remota antiguidade até nossos dias, através de todas as
Confraternidades secretas, cuja longa corrente jamais foi
interrompida.”
O pensamento de René Guénon chegou à maturidade
com A crise do mundo moderno (1927). Nesse volume, ele mescla sua
crença em uma “sabedoria perene” com o pessimismo histórico e o
ideário antidemocrático de Oswald Spengler, autor da obra em dois
tomos O declínio do Ocidente (1918 e 1923), que serviu de inspiração
para o nazifascismo. Ao debruçar-se sobre o mal-estar da cultura
moderna, Guénon centra sua crítica na perda de contato do Ocidente
com a base espiritual tradicional:
“O moderno Ocidente é dito cristão,
mas isso não é verdade: a visão moderna é anticristã, porque é
essencialmente antirreligiosa; e é antirreligiosa porque, de modo
ainda mais geral, é antitradicional.”
Valendo-se de conceitos da mística hinduísta,
Guénon propõe uma visão cíclica da história. Nesse arcabouço, a
cultura ocidental, dominante no planeta, estaria às portas de um
colapso civilizacional:
“De acordo com todas as indicações
fornecidas por doutrinas tradicionais, entramos de fato na última
fase do Kali-Yuga, o mais escuro período da atual ‘idade das
trevas’, o estado de dissolução do qual é impossível emergir
senão mediante um cataclisma, pois não é apenas de um mero
reajustamento que necessitamos neste estágio, mas de uma completa
renovação. (...) Não chegamos acaso à terrível era anunciada nos
Livros Sagrados da Índia, em que ‘as castas irão misturar-se, e
em que mesmo a família deixará de existir’? Basta olhar em torno
para convencer-se de que este é o estado do mundo de hoje, e para
notar em todos os lados a profunda degeneração.”
O trecho citado revela o caráter essencialmente
antidemocrático do perenialismo. No entender de Guénon e seus
seguidores, as sociedades são divididas em “castas”. Nas
culturas tradicionais, haveria um sólido pacto de solidariedade
entre a casta sacerdotal e a casta guerreira — e desse pacto
derivariam a vitalidade e a estabilidade dessas sociedades. As
sociedades modernas, contudo, estariam sujeitas à “lei de
regressão das castas”. Quem nos explica o conceito é o mitógrafo
italiano Julius Evola (1898-1974), sem dúvida o mais relevante
parceiro de René Guénon na formulação do perenialismo. Eis um
trecho de Revolta contra o mundo moderno (1934), obra na qual Julius
Evola aprofunda os aspectos políticos do pensamento de Guénon:
“Uma progressiva mudança de poder e de
tipo de civilização produziu-se de uma casta para a outra, desde os
tempos pré-históricos (dos líderes sagrados para a aristocracia
guerreira, para os comerciantes, e finalmente para os servos); estas
castas correspondiam, em civilizações tradicionais, à
diferenciação qualitativa das principais possibilidades humanas. Em
face desse movimento geral, tudo o que diz respeito aos vários
conflitos entre os povos, a vida das nações e outros acidentes
históricos desempenha um papel apenas secundário e contingente.”
Comparemos os textos acima com aquilo que Olavo de
Carvalho nos ensina em seu principal livro, O jardim das aflições,
uma obra perenialista de cabo a rabo:
“Acima das religiões, acima das
consciências individuais, é ao Estado — casta dirigente ou
aristocrática — que cabe, sob as bênçãos da intelectualidade —
casta sacerdotal — dirigir o processo de modernização, e
portanto, determinar o sentido da vida coletiva, os valores e
critérios morais, o certo e o errado, o verdadeiro e o falso.”
“Essa ideologia (...) não podendo eliminar as
castas governantes, ocultou-as, aumentando assim o seu poderio. E,
quando elas ressurgem sob nomes como ‘burocracia estatal’ e
intelligentsia, ninguém as reconhece, pois todos creem que castas só
existem na Índia ou no passado medieval.”
Segundo os teóricos do perenialismo, as grandes
culturas tradicionais começam a decair no momento em que as castas
inferiores de mercadores e servos assumem o poder político,
ocasionando o progressivo declínio dos valores sociais. Diz René
Guénon:
“O mais decisivo argumento contra a
democracia pode ser resumido em poucas palavras: o superior não pode
proceder do inferior, porque o maior não pode proceder no menor;
esta é uma absoluta certeza matemática que nada pode questionar.
(...) O povo não pode conferir um poder que ele mesmo não possui; o
verdadeiro poder somente pode vir de cima, e é por isso que ele
apenas pode ser legitimado por algo pairando acima da ordem social,
ou seja, por uma autoridade espiritual.”
Diante de tão reacionário credo, não surpreende
que René Guénon tenha colaborado com 25 artigos para a revista Il
Regime Fascista, editada por Julius Evola, entre 1934 e 1942. A
tentativa de alguns dos seguidores de Guénon de ocultar a natureza
antidemocrática de seu pensamento chega a ser risível,
especialmente quando se analisa o conteúdo de suas obras da
maturidade. Em O reino da quantidade e os sinais dos tempos (1945), a
fantasia tradicionalista resulta em uma ruptura completa com a
modernidade. Guénon investe contra a sociedade de consumo, a ciência
moderna, o darwinismo, a psicanálise e a filosofia ocidental,
aproveitando o ensejo para denunciar os “sábios do Sião”:
“Por que será que os principais
representantes das novas tendências, como Einstein na física,
Bergson na filosofia, Freud na psicologia, e muitos outros de menor
importância, são quase todos judeus de origem, senão pelo fato de
que há algo envolvido que está intimamente ligado ao aspecto
‘maléfico’ e corrosivo do nomadismo quanto ele é desviado, e
porque esse aspecto deve inevitavelmente predominar em judeus
desgarrados de sua tradição?”
Note-se que o texto foi publicado em 1945, já com
a Segunda Guerra Mundial terminada, os nazistas vencidos e o
Holocausto perpetrado. Sem dúvida, um autor sintonizado com os
sinais dos tempos. Em Metafísica da guerra, uma coletânea de
artigos escritos entre 1935 e 1950, Julius Evola explica o horror que
os membros da escola perenialista sentem das ideologias
revolucionárias:
“A civilização de tipo puramente
heróico-sacral somente pode ser encontrada no período mais ou menos
pré-histórico da tradição ariana. Ela foi sucedida por
civilizações no topo das quais já não estava a autoridade dos
líderes espirituais, mas de expoentes da nobreza guerreira — e
esta foi a era das monarquias históricas, que se estendeu até o
período das revoluções. Com as revoluções francesa e americana,
o Terceiro Estado tornou-se o mais importante, determinando o ciclo
das civilizações burguesas. Finalmente, o marxismo e o bolchevismo
parecem levar à queda final, com a passagem do poder e da autoridade
às mãos da última das castas na antiga hierarquia ariana.”
Diante dessa ameaça à harmonia hierática das
sociedades, Julius Evola não hesita em propor:
“O Fascismo se nos mostra como uma
revolução reconstrutiva, dado que afirma um conceito aristocrático
e espiritual da nação, oposto tanto ao coletivismo socialista e
internacionalista quanto à noção democrática e demagógica da
nação.”
A opção da maior parte dos perenialistas pelo
islã deriva sobretudo da incompatibilidade de suas ideias com a
ortodoxia cristã. Sendo gnósticos e ocultistas, os perenialistas
enxergam uma antinomia incontornável entre a religião oficial, com
seus ritos formais e sua moral rígida (modalidade exotérica), e a
espiritualidade superior, marcada pela iluminação intelectual,
pelos ritos iniciáticos e pela teurgia (modalidade esotérica). Eis
o que nos diz Frithjof Schuon, em Gnose: sabedoria divina (1959):
“A distinção exotérica entre
‘religião verdadeira’ e ‘falsas religiões’ é substituída
para o gnóstico pela distinção entre ‘gnose’ e ‘crença’
ou entre ‘essência’ e ‘formas’. Somente a perspectiva
sapiencial é um esoterismo no sentido absoluto; em outras palavras,
somente ela é necessária e integralmente esotérica, pois somente
ela se projeta além de todo relativismo.”
No entender dos “homens espirituais” — assim
os perenialistas chamam a si mesmos —, a religião oficial seria
uma forma superficial da vivência espiritual, concebida em benefício
dos homens inferiores, incapazes de acessar o conhecimento superior.
A philosophia perennis, em contraste, seria a essência gnóstica da
espiritualidade universal. Disse Olavo de Carvalho, em artigo na
revista Planeta:
“Já o esoterismo, ao contrário, sendo
um único em sua essência (ele é a Philosophia Perennis, a verdade
metafísica una, eterna, supraformal e transcendente), varia,
entretanto, nas distintas formas históricas que o expressam,
havendo, portanto, um esoterismo cristão, um islâmico, um judaico,
etc.”
Engana-se Olavo. Enquanto o cristianismo real
(seja ele católico, ortodoxo ou protestante) se funda na humildade,
na igualdade entre todos e no amor ao próximo, a gnose conduz a uma
espiritualidade elitista e arrogante, que divide os seres humanos em
diferentes categorias e que advoga a superioridade dos homens
“espirituais” sobre os homens “psíquicos” e “carnais”.
Mais importante ainda, a visão gnóstica da espiritualidade é
incompatível com os mistérios da Encarnação e da Trindade,
conforme demonstrou Irineu de Lyon, em Adversus haereses (c. 180
d.C.).
No cristianismo real, os aspectos exotéricos e
esotéricos, imanentes e transcendentes, formais e místicos da
espiritualidade estão reunidos em Cristo e sua Igreja. Não existe
um deus espiritual que se contraponha ao demiurgo do mundo material
nem qualquer conhecimento oculto que permita ao iniciado acessar
magicamente os planos superiores da existência. Há, em contraste,
uma Trindade de amor na própria essência da Divindade. E existe um
projeto de redenção do homem, centrado no sacrifício, na morte e
ressurreição de Jesus Cristo. Assim nos diz o apóstolo São Paulo:
“Nós, porém, anunciamos Cristo
crucificado, que para os judeus é escândalo, para os gentios é
loucura, mas para aqueles que são chamados, tanto judeus como
gregos, é Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus.” (1 Coríntios
1: 23, 24)
O perenialismo de Guénon, Evola e Schuon, por
mais que se esforce em demonstrar a unidade das grandes tradições,
fundindo teísmo e panteísmo em um mesmo amálgama inconsistente,
tende inexoravelmente a aderir ao esoterismo islâmico como única
vertente universal da gnose. Para os cristãos, a gnose é anátema.
Para israelitas, hindus e chineses, ela não é universalizável. Daí
a opção de René Guénon pelo esoterismo sufi. Em 1930, ele se muda
para o Cairo e converte-se ao islã:
“Devemos outra vez recordar que o
significado adequado da palavra islã é ‘submissão à Vontade
Divina’; portanto, diz-se, em certos ensinamentos esotéricos, que
todo ser é muçulmano, no sentido de que claramente ninguém pode
escapar a essa Vontade; e, desse modo, cada um necessariamente ocupa
o lugar que lhe cabe no Universo como um todo.”
A adesão de Guénon ao islã não representa,
contudo, a opção por um exclusivismo maometano. Desde suas origens,
no primeiro século da era cristã, a gnose tem o vício de atuar
como uma espiritualidade parasitária, que vive à sombra de grandes
religiões. Ela se apropria dos símbolos, conceitos, práticas e
textos sagrados formulados pela ortodoxia originária,
transmutando-os em uma religiosidade completamente distinta. Sendo
uma perspectiva pseudofilosófica, ligada à magia e aos cultos de
mistérios, a gnose usa as grandes tradições religiosas para
esconder-se. O gnóstico é, antes de tudo, um mago dissimulado, cuja
suposta espiritualidade não passa de pura egolatria. Eis um trecho
sintomático de Olavo de Carvalho:
“Note-se que essa possibilidade de
transitar livremente de uma Tradição a outra é, hoje como sempre,
apanágio exclusivo dos grandes mestres espirituais.”
Ao envolver-se com o esoterismo perenialista,
Olavo de Carvalho converteu-se ao islã. Foi uma conversão
meia-sola, aberta a todo tipo de influência “metafísica”, mas
foi uma conversão. Esse período rendeu-lhe, além de diversos
livros sobre astrologia, um volume sobre o profeta Maomé:
“Meu livro O profeta da paz: estudos
sobre a interpretação simbólica da vida do profeta Mohammed
(Maomé), ainda inédito nove anos após ter recebido um prêmio do
governo da Arábia Saudita, é um estudo sobre a significação da
profecia na História, ilustrado pelo caso do único profeta de cujos
atos e palavras restou para o historiador moderno uma documentação
abundante. Foi esse estudo que me persuadiu, de uma vez para sempre,
de que o fenômeno da profecia é o gonzo sobre o qual gira o portal
da compreensão histórica, e de que a história
reduzida às dimensões natural e civil (...) é apenas uma crônica
provinciana, sem qualquer poder de elucidar os fatores decisivos, os
retornos cíclicos, as ascensões e quedas dos impérios e das
doutrinas.”
No cristianismo real, a profecia não se confunde
com vidência política ou determinismo histórico. A profecia, na
perspectiva cristã, fala do Cristo e de seu Reino. Os perenialistas
nada entendem do tema. Mas Olavo de Carvalho, eterno discípulo do
mago francês, pensa de modo distinto. Assim ele explica, em O jardim
das aflições:
“O grande reformador maçônico do
século XX, René Guénon, encontrou a organização num estado de
vácuo doutrinal. (...) Guénon preenche esse vácuo com a mais densa
metafísica. (...) A polêmica católica contra René Guénon
continua impressionando pela sua incapacidade de enfrentá-lo no
terreno propriamente metafísico. As célebres objeções de Mons.
Daniélou quanto ao simbolismo da cruz mostram apenas uma
inferioridade de QI. Assim como Daniélou, Paul Sérant e outros
adversários católicos de Guénon fogem para o terreno teológico e
moral, onde se sentem abrigados sob pressupostos de fé que, no
entanto, não são metafisicamente válidos.”
Ou seja, segundo Olavo de Carvalho, a cristologia
e o mistério da Trindade não são temas válidos. Metafísico, para
ele, é o “islamismo cultural” de René Guénon. Em O simbolismo
da cruz (1931), livro escrito após sua conversão, o bruxo francês
tece incontáveis loas aos elementos místicos do taoismo, do
hinduísmo e do islamismo, enquanto projeta sobre essas tradições
religiosas os conceitos unificantes inventados por ele mesmo. Quanto
ao cristianismo, busca diluí-lo nessa geleia geral, relegando a
figura ímpar do Cristo a uma única menção em todo o volume:
“A cruz é um símbolo que, em suas
várias formas, pode ser encontrado praticamente por toda parte, e
desde o mais remoto tempo; está, portanto, longe de pertencer de
modo particular ou exclusivo à tradição cristã como alguns podem
ser tentados a acreditar. (…) Em particular, se Cristo morreu na
cruz, pode-se dizer que isso ocorreu em razão do valor simbólico
que a cruz possui em si mesma, o qual foi sempre reconhecido por
todas as tradições.”
Em suma, temos em René Guénon a trajetória
exemplar de um herege gnóstico em upgrade para a classe de apóstata.
Sua opção recorda aquelas de Sabbatai Zevi, mestre cabalista e
falso messias, convertido ao islã em 1666; e de seu seguidor Jacob
Frank, nominalmente convertido ao catolicismo em 1759. Conforme
demonstrou o estudioso Gershom Scholem em seu livro Major trends in
Jewish mysticism, ambos os místicos se converteram por mero cálculo
político, mantendo suas práticas gnóstico-cabalistas de modo
oculto, enquanto professavam uma fé pública que lhes era
conveniente. Os perenialistas agem exatamente assim.
Alguém poderá perguntar: e quem se importa com
isso? Qual o problema de uma falsa conversão, de uma religiosidade
apenas de fachada? O problema está nas consequências lógicas da
fraude. Uma espiritualidade enganosa e dissimulada gera,
necessariamente, maus frutos. O próprio Cristo nos ensina:
“Guardai-vos dos falsos profetas, que
vêm a vós disfarçados de ovelhas, mas por dentro são lobos
ferozes. Pelos seus frutos os conhecereis.” (Mateus 7: 15,16).
O critério evangélico fica evidente no caso dos
principais expoentes do perenialismo. René Guénon desenvolveu uma
paranoia patológica, que deu origem a toda uma tradição de
teóricos da conspiração, além de flertar com ideias
antidemocráticas e antissemitas. Julius Evola uniu o fermento dos
fariseus ao fermento de Herodes, para tornar-se um entusiasta de
Mussolini, um colaborador da SS nazista e o principal teórico do
neofascismo europeu no pós-guerra. Frithjof Schuon, por sua vez,
elevou à máxima potência o charlatanismo intelectualizado da
escola perenialista.
Em 1991, um dos discípulos de Schuon deixou a
comunidade que ele havia criado nos EUA, em Bloomington, Indiana. Em
seguida, levou o “filósofo” aos tribunais, acusando-o de haver
abusado de três adolescentes, nas cirandas místicas ou “encontros
primordiais” que promovia. A acusação acabou sendo retirada, após
acordo amigável. Mas diversos testemunhos corroboraram a informação
de que havia contatos íntimos entre o mestre e as jovens durante
esses eventos. O escândalo destruiu a reputação de Schuon e
amargurou o restante de sua vida.
Igualmente reveladoras eram as supostas visões
místicas do mestre de Olavo de Carvalho. Schuon afirmava que a
“Virgem Maria” lhe aparecera, por diversas vezes, inteiramente
nua, ocasiões nas quais o envolvia em dança inebriante. Em Against
the modern world, Mark Sedgwick conta sobre as fotos que lhe foram
enviadas logo ao início de sua pesquisa. O choque provocado pelas
revelações fez com que o estudioso abandonasse a ideia de escrever
apenas um artigo acadêmico e passasse à tarefa mais exaustiva de um
livro sobre a escola perenialista:
“Numa certa manhã, encontrei em minha
caixa de correio um robusto envelope enviado por Rawlinson, contendo
cópias de algumas fotografias. Sentei-me em minha escrivaninha e
pus-me a, alternadamente, enterrar as fotografias debaixo de outros
papéis e tirá-las dali novamente, entre fascinado e horrorizado. Lá
estava Schuon vestido como chefe de uma tribo de índios americanos,
cercado de jovens mulheres em biquínis. Havia também Schuon
completamente nu, exceto pelo que parecia ser um
capacete viking. E havia ainda uma pintura feita por Schuon da Virgem
Maria, igualmente nua, com a genitália claramente exposta.”
Tais revelações, além de repugnantes em si, nos
mostram bem em que consiste a síntese perenialista. O quadro a que
se refere Mark Sedgwick nos mostra não a Virgem Maria real, mas o
conceito que Frithjof Schuon tem de uma Grande Deusa, sensual e
devoradora. Ela se mostra sexualizada ao iniciado precisamente porque
vai com ele operar uma hierogamia mística — que o levará a
ascender a planos superiores do conhecimento. Assim atua o misticismo
gnóstico: deturpando a simbologia de todas as religiões,
apropriando-se indevidamente e corrompendo o que elas têm de mais
sagrado, apenas para projetar nesse furto “metafísico” os
conceitos inerentes a seu pretenso saber oculto.
Foi nesse meio extremamente problemático que
Olavo de Carvalho se formou. E são ainda hoje os preconceitos
perenialistas que moldam seu pensamento e sua visão de mundo. Em
especial, foram as obsessões guenonianas que informaram sua
principal obra, O jardim das aflições:
“Quando examinada do ponto de vista de
suas consequências psicológicas, culturais e espirituais, a
ascensão do Império mundial é, como vimos ao longo dos últimos
capítulos deste livro, uma ameaça tenebrosa. (...) O que está em
jogo no mundo não é, portanto, um mero conflito entre ideologias,
mas sim a possibilidade de sobrevivência espiritual da humanidade
num mundo onde todas as opções ideológicas díspares e antagônicas
se uniram num pacto entre inimigos para varrer da face da Terra o
legado das antigas religiões.”
A filiação perenialista de Olavo de Carvalho foi
examinada à exaustão pelo professor Orlando Fedeli, historiador
competente e tomista de mão-cheia, em seu devastador artigo “A
gnose ‘tradicionalista’ de René Guénon e Olavo de Carvalho”,
publicado em 2001:
“A doutrina de Guénon, como a de Olavo,
não tem apenas alguns pontos gnósticos isolados, mas os princípios
gnósticos que eles adotam formam um sistema coerente, que exige
chamá-los de gnósticos, ainda que eles não explicitem alguns
pontos próprios da Gnose completa. Essa falta de explicitação de
alguns pontos da totalidade do sistema gnóstico se nota
especialmente em Olavo, que tem uma Gnose menos elaborada pela sua
inferioridade em relação a Guénon, quer quanto à inteligência,
quer quanto à cultura, quer ainda quanto ao valor de seus livros.”
Engana-se quem acredita ser Olavo de Carvalho um
filósofo católico, de linhagem aristotélica. Criado à sombra de
René Guénon, Julius Evola e Frithjof Schuon, o alegado fervor
cristão do mago de Richmond se revela mera pantomima. Por detrás de
suas teorias conspiratórias, de seu desconforto com a modernidade,
de seu anticomunismo ferrenho e de sua agressividade verbal reside a
gnose obscura da escola perenialista. Basta notar que sua obra não
evoca qualquer das virtudes cristãs, mas antes aponta para o inverso
delas: em lugar da humildade, a soberba; ao invés da compaixão, o
rancor; não havendo mansidão, a violência; na ausência da
caridade, a pura vontade de poder. Assim é Olavo, o demolidor.